segunda-feira, 19 de maio de 2014

o conforto da lama

As eleições europeias estão aí, mas atrevo-me a dizer que a maioria das pessoas não sabe, ou não quer, votar. A perda de fé nos partidos é um sentimento generalizado, mas em vez de provocar uma reacção nas pessoas, é apenas mais uma desculpa para a inércia. Já ninguém acredita em ninguém, dizem que é tudo farinha do mesmo saco. Alternativas? Não têm. Não acreditam que já tenha chegado o momento de fazer algo. Estão à espera de que alguma coisa mude, mas não sabem bem o quê. Têm esperança de que alguém faça qualquer coisa mas, enquanto esperam, vão deixando acontecer.

Estamos perante uma epidemia de apartidários e de pessoas que não tomam posição sobre nada. Até nas coisas mais básicas são inertes - quantos portugueses ainda abastecem nas grandes gasolineiras apesar de saber que são elas que se aproveitam das oscilações no preço do petróleo para aumentar preços e nunca os voltar a descer? Quantos portugueses ainda compram no Pingo Doce apesar de ser do conhecimento público que a empresa paga parte dos seus impostos na Holanda? A resposta é sempre a mesma: «não vale a pena, vamos ser roubados por uns ou por outros». Não vale a pena. E eu pergunto: então o que raio é que vale a pena?

Não vale a pena ter a dignidade de ir comprar a outro lado e não ser sodomizado por um gigante económico que está a sugar o País? Não vale a pena ter a responsabilidade de ir votar e pelo menos tentar que vingue uma linha ideológica com a qual nos identificamos?

Não tomar posição sobre nada deve ser altamente confortável. Eu considero-o embaraçoso, mas presumo que, para quem assim é, seja confortável. Fingimos que não se passa nada, ou que tudo o que se passa não se deve a nós. Mas nada disso é verdade - as pessoas devem pensar nas consequências do deixar acontecer, porque foi precisamente por causa do "deixar acontecer" que a democracia chegou onde chegou. E em vez de esperar - pelo atentado à bomba que mate aquela cambada toda, ou pelo salvador da pátria que há de chegar e nos livrar desta escória toda, ou da revolução que alguém há de fazer e criar um sistema que nos livre desta corrupção toda - tomar posição. Sobre tudo e mais alguma coisa. Ser "cidadão" não serve apenas para receber subsídios ou para ter tema de queixume nos almoços de família aos domingos. Ser cidadão vem com responsabilidades que têm de ser cumpridas: informarmo-nos sobre o que se passa no país em termos políticos, económicos, sociais - e tomar posição.

Só essa tomada de posição é que pode garantir a defesa da democracia. Por isso eu digo: votem, assumam a vossa responsabilidade, assumam o vosso papel enquanto cidadãos, enquanto pessoas donas do vosso próprio futuro e do dos vossos filhos. E tomem posições, opinem, defendam argumentos, informem-se. No fundo, recusem ser um verme! Ou qualquer coisa mole que se arrasta nas ruas, sem ideais, sem acção, um queixume personificado, inconsequente e vazio.

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