segunda-feira, 26 de dezembro de 2011

cinco coisas impossíveis antes do pequeno-almoço

Este post podia chamar-se algo como "cinco arrependimentos que as pessoas à beira da morte regra geral têm", porque é sobre isso que vou falar. Mas achei esse título demasiado deprimente (e longo e com um ritmo de leitura esquisito). Hoje apeteceu-me pensar positivo ultimamente ando assim e preferi imaginar a morte como um daqueles pequenos-almoços maravilhosos, que incluem ovos com salsichas, sumo de laranja, panquecas, morangos, boiõezinhos de doce com folhinhos na tampa, croissants em miniatura, etc, etc. Adiante.

Li recentemente um artigo sobre os principais arrependimentos que as pessoas, no seu leito de morte, confessam em relação à vida que levaram. E são eles:
  1. Gostava de ter tido coragem para levar uma vida que fosse fiel a mim próprio e não a vida que os outros esperavam que eu levasse.
  2. Gostava de não ter trabalhado tanto.
  3. Gostava de ter tido a coragem de expressar os meus sentimentos mais vezes.
  4. Gostava de ter mantido o contacto com os meus amigos.
  5. Gostava de me ter permitido ser mais feliz.

Estas cinco coisas, impossíveis para alguns antes do grande pequeno-almoço, ressoaram-me no cérebro de uma maneira impressionante. Fizeram uma chinfrineira infernal, atrevo-me a dizer. Porque se fosse agora a minha hora de ir enfardar ovos com salsichas, eu teria alguns dos mesmos arrependimentos.

Assim, se o último post foram os meus desejos para 2012, vejam este como o seu "post-script" indispensável. O número 1 diz-me muito e é algo em que vou apostar à séria em 2012... doa a quem doer.

E vocês? Identificam-se?

segunda-feira, 19 de dezembro de 2011

desejos para 2012


Que todas as vossas escolhas no próximo ano, e daí em diante, sejam feitas por amor e não por medo. E apenas isto. Foi a maior lição que 2011 me ensinou. E 2012 vai ser em grande, trust me. O ano da renovação e da redescoberta. Boa sorte com a vossa.

quinta-feira, 24 de novembro de 2011

fiz as pazes com a abundância

Toda a vida me disseram que o mal de muita gente é "a abundância". Mas afinal isso é um erro descomunal. A abundância não tem culpa nenhuma.

Aprendi que se deve abraçar a abundância e viver em abundância... Criticá-la significa presumir que o que queremos, o que gostávamos de ter (ou gostávamos que acontecesse) não existe em número suficiente para todos. É acreditar que uns são mais merecedores que outros. É esquecermo-nos de que na verdade somos todos o mesmo e um só

Na verdade, podemos ter tudo o que quisermos, sempre que quisermos. Isso, por si só, não faz de nós piores pessoas. 

Por isso fiz as pazes com a abundância. Ela não tem culpa nenhuma dos feitios de certas pessoas. O que terá, não sei.


quarta-feira, 16 de novembro de 2011

computer says "no"

Estava a ler um artigo ultra engraçado e ultra nerd - este - no TechRepublic sobre mensagens de erro absurdas que os computadores às vezes apresentam e surgiu-me a dúvida: porque é que os computadores, nos filmes e na vida real, têm de falar "à computador"? Afinal de contas, fomos nós que os programámos. 

Porque é que em vez do "Invalid Universal ID", do "HTTP Proxy Error" (este já chateia) ou do temível "FATAL ERROR" não podemos ter uma coisa mais... humana, do género "Ups, isto deixou de funcionar. Reinicie o computador que isso às vezes resolve. Boa sorte."

É que, a continuar assim, a famosa revolução das máquinas não será feita sequer por robôs que falam inglês com sotaque alemão (será que o casting foi propositado?)... já estou a imaginar hordas de super computadores musculados, mas com cabeça de torradeira apenas por nunca lhes terem ensinado o "bê e á: bá".

Será esta uma questão de ego, ou de falta de jeito? Por outras palavras, será o ser humano tão presunçoso que não quer munir as máquinas de uma linguagem mais próxima de si, ou... serão os programadores assim tão maus copywriters?

segunda-feira, 14 de novembro de 2011

o labirinto


Podemos acreditar que Ofélia morreu sozinha e triste às mãos do seu odioso padrasto. Parece que foi isso que aconteceu... e faz sentido, não faz? Mas também podemos acreditar que ela era mesmo uma princesa (imagine-se) e governou benevolamente durante séculos e séculos ao lado dos seus pais num reino de magia, sempre com os seus sapatinhos bonitos e confortáveis.

Como em tudo na vida, é tudo uma questão de perspetiva. Eu acredito na segunda opção.

sexta-feira, 11 de novembro de 2011

para o universo


Ouvi dizer (e li) que o Universo está sempre à escuta e basta pedir, que ele dá. Ultimamente tenho confirmado esta teoria, aparentemente absurda e irracional, mas tão boa. E é tão bom e tão estranho para mim pôr a racionalidade de lado uns segundos por dia.

Por isso cá fica uma lista das coisas que quero lá para casa e que vão acabar por lá aparecer:
  1. Janelas novas (está quase)
  2. Cómoda dos anos 70, para o mega hall que brevemente será um closet (mas que fino)
  3. Sapateira, tapete e candeeiro para o mesmo espaço 
  4. Bengaleiro de parede
  5. Móvel para substituir a mesa de cozinha (essa coisa tão inútil - não, mas preciso de espaço de arrumação)
  6. Móvel de casa de banho
  7. Um tampo de sanita novo
  8. Caixas, prateleiras e coisas que tais para organizar a dispensa
  9. Uma mini secretária para substituir a mesa do quarto
  10. Um scottish fold
Olha um post "fútil"... mas o blogue é meu e publico o que quiser. Tão bom e curiosamente, também tão estranho.


quinta-feira, 3 de novembro de 2011

sobre a essência

"Somos aquilo que fazemos" - sempre ouvi dizer. Mas será que isto não é simplificar um bocado a coisa? Quando nos perguntam quem somos, temos tendência a responder "sou polícia, tenho 39 anos, sou pai de 2 filhos"... ok, eu não responderei isto com certeza. Regra geral, somos um conjunto de estatutos que correspondem a um conjunto de papéis que temos de desempenhar. 

Mas o que restaria, se nos tirassem tudo isso? O que é que resta quando pomos de lado o trabalho, as qualificações, os gostos pessoais, os hobbies? O que é que fica para além do tempo, do país, da nacionalidade?

Quem somos nós?

sexta-feira, 7 de outubro de 2011

o que vos mantém unidos

Esta semana disseram-me algo que me deixou a pensar... nunca tinha pensado nisso e é mais uma verdade básica daquelas que nós até sabemos mas nunca parámos para refletir sobre ela.

O que mantém uma relação nem sempre é o amor entre duas pessoas. Falo daquilo que mantém uma relação ao longo de meses, anos, uma vida... e não daquilo que nos leva a iniciar uma relação. Por vezes é o estatuto, por vezes o trabalho de cada um, noutras vezes são as vantagens que cada um tem para oferecer ao outro, o envolvimento familiar... e às vezes um destes fatores é suficiente para que uma relação faça sentido e se mantenha a vida toda. Então e o amor? Desde que a relação possa ser explicada, justificada racionalmente por fatores como os que antes descrevi, não se pensa muito nisso do amor. Se a relação faz sentido, é implícito que o amor lá ande, algures. E isso torna as coisas muito mais simples. Não digo que seja certo ou errado manter a relação por que motivos for (há motivos mais certos que outros, convenhamos), mas então e o que aconteceu ao amor?

Manter uma relação por amor, fará sentido?

quinta-feira, 15 de setembro de 2011

mulheres que amam demais


Uma relação verdadeiramente horrível tem a mesma função que uma droga potente.

As mulheres que amam demais são aquelas que acreditam que, se fizerem tudo o que estiver ao seu alcance pelo homem com quem estão, ele irá finalmente amá-las de volta e modificar-se, pelo bem da relação. São aquelas que acreditam que o sofrimento que têm é diretamente proporcional ao amor que sentem e que, se sofrem tanto, é porque ele é de certeza absoluta o homem certo. E assim vão tolerando mais e mais, na esperança de que as coisas mudem se forem suficientemente compreensivas. Os amigos perguntam-lhe "mas como é que tu aguentas isso?" e os conhecidos perguntam-se "mas como é que ela anda com aquele?". E nem elas conseguem explicar porque amam tanto uma pessoa que lhes dá tão pouco ou que, em certas ocasiões, as trata tão mal.

Também eu pensava que não havia uma explicação para isso e esse pensamento estava a dar comigo em doida. Seria eu maluca, burra, irracional? Porque é que, depois de tudo o que se passou, ainda amo tanto? Mulheres que Amam Demais, de Robin Norwood, é um estudo de centenas destes casos e nas suas páginas encontrei a explicação. Agora, é tudo tão racionalmente justificável... que é quase uma desilusão. O que eu pensei ser um grande amor (doentio, é certo, mas amor) afinal pode ser explicado por factores reais, quase palpáveis, que têm a ver com o meu passado e com o passado dele. E vemos que o arquiteto louco afinal se limitou a juntar duas peças de um puzzle - eu e ele - uma noite num café, e que o trabalho de encaixe foi todo, todinho, feito por nós.

Este livro ajudou-me a perceber que às vezes nós encontramos pessoas para as quais fomos verdadeiramente talhadas: as nossas almas-gémeas ou caras-metade. Não tenho dúvida absolutamente nenhuma de que ele e eu fomos talhadinhos um para o outro, em termos emocionais. E de que, com um ajuste aqui e ali (nomeadamente com mais uma cedência da minha parte, a única que não fiz, ou da parte dele, que também não a fez) teriamos mesmo ficado "juntos para sempre".Daí que agora o desencaixe se torne tão doloroso.

Mas ajudou-me também a perceber que as mulheres que amam demais têm o chip trocado e precisam de fazer reboot ao sistema. Desaprender tudo aquilo que a infância lhes ensinou e adquirir novos hábitos - os hábitos de uma relação saudável, onde não amem demais.

Aprender que devemos fugir do que nos faz mal e a cultivar o que nos faz bem parece tão fácil... mas é uma tarefa hercúlea para quem desde muito cedo teve de se habituar a que o Mal não era assim tão mau e também se habituou tão pouco ao Bem que agora... não se sente confortável com ele.

As mulheres que amam demais normalmente, se não podem amar demais, então não amam de todo. Ou seja, é difícil sentirem-se atraídas por um homem que as valorize, mime e que se mostre carinhoso - esses são vistos como enfadonhos e fracos. Pelo contrário, quando encontram um homem frio, distante, que represente um desafio, ou independentemente das suas características específicas, um homem com o qual possam reviver uma relação a que assistiram ou que viveram na infância, sentem-se como que fulminadas por um raio. E sentem-se muito, muito confortáveis, por mais horrível que seja para as pessoas de fora. Porque estão habituadas, foram habituadas a isso.

Este livro aborda a questão com muitos mais detalhes que não posso explorar aqui e contém a explicação da citação que pus no início deste post. O livro mostra-nos porque valorizamos tanto os amores desesperados atualmente e menosprezamos ou consideramos "mornas" as relações com base noutros princípios que não a paixão desesperada. Este livro ajuda-nos a perceber porque é que nos sentimos tão atraídas por aquela pessoa e porque é que ela se sentiu tão atraída por nós. Ajuda-nos a perceber o que podia acontecer caso a pessoa, finalmente, mudasse. Ou caso nós fizéssemos a derradeira cedência. E o que é realmente preciso para que um casal que ama demais transforme uma relação de dependência mútua numa relação saudável. E como podemos fazer reboot ao sistema, para que possamos começar a apreciar o Bem e sentir aquilo que é suposto sentir-se na presença do Mal - não prazer nem conforto nem familiaridade, mas sim repúdio.

Se conhecem alguém que ama demais (homem ou mulher), ofereçam-lhe este livro. A pessoa pode não acreditar nos chamados livros de "auto-ajuda" (eu também não acredito) e achará certamente que a sua relação "não é tão má" como aquelas que são retratadas no livro, mas peçam-lhe que leia apenas o Prefácio e depois logo decidem se continuam ou não.

Mal não faz... e também, se fizer... nós até gostamos.

segunda-feira, 5 de setembro de 2011

my only friend, the end (pt II)


Há momentos estúpidos na vida de uma pessoa. Por exemplo, estar no trabalho, a fazer força para nos concentrarmos e ignorarmos o monstro que grita cá dentro, e de repente surgir-nos uma imagem na cabeça: um pequeno filme.

Recebemos uma chamada - era ele. "Vem cá fora". Olhamos pela janela e vemos uma pequena confusão à entrada. Um cavalo branco, um ramo de flores, ele despojado de orgulho e carregadinho de reconhecimento; a Verdade inundou-o finalmente e agora sai-lhe por todos os poros.

Vejo os nossos amigos, os nossos familiares, os nossos colegas. E fica tudo bem, porque fica tudo provado ali, naquele momento. Não há dúvidas nem há argumentos. Nem tem de haver. Como uma tempestade que rebenta depois de um dia de calor infernal, não temos de pedir desculpa nem justificar nada a ninguém. Simplesmente somos, para sempre.

Há momentos mesmo muito estúpidos na vida de uma pessoa.

domingo, 28 de agosto de 2011

o amor é

Ultimamente faço listas de coisas para não me esquecer. Listas de coisas básicas que eu pensava que sabia de forma inata, mas que afinal não. Por isso cá está uma lista essencial (sem ordem específica) que pode ser trazida a público, de coisas que aprendi com as relações que me rodeiam e não só. Convém não esquecer como se caracteriza, universalmente, uma boa relação.

Hoje disseram-me que metade do mundo anda à procura da outra metade. E eu quero saber o que procurar daqui para a frente. O que é inaceitável acho que já aprendi.

  1. Poder dizer "amo-te" quando nos apetece, sem medo que a pessoa desate a correr e sem pensar que lhe estamos a dar poder para nos magoar.
  2. Decorar uma casa em conjunto e resolver os problemas caseiros (como chaves deixadas dentro de casa ou um gato adulto a quem lhe deu para começar a fazer xixi no chão) em conjunto.
  3. Saber o que oferecer no dia de anos, no Natal e de vez em quando ao longo do ano, sem ter de perguntar, mas apenas porque prestámos atenção.
  4. Sentir orgulho da pessoa que temos ao lado, daquilo que alcançou na vida e das atitudes que tem.
  5. Olhar para a pessoa e transmitir-lhe o que estamos a pensar sem ter de dizer nada.
  6. Dormir sempre na mesma cama, seja abraçadinho no inverno ou só com um pé a tocar no outro no verão.
  7. Estar deitado a ler antes de dormir. Ou ler um para o outro.
  8. Ir a um festival de Metal pesado connosco, mesmo quando se gosta de rock antigo.
  9. Chegar a casa e ter um jantar feito de vez em quando.
  10. Gostar do mesmo tipo de pipocas no cinema.
  11. Cumprir promessas, sejam elas de amor ou outras quaisquer.
  12. Ser fiel e transparente, sempre verdadeiro.
  13. Ter uma música "nossa" que não seja a "Love the way you lie", nem a "Bleeding Love", nem a "Rolling in the Deep".
  14. Pôr o outro em primeiro lugar nas alturas em que isso é preciso.
  15. Ir passear de mãos dadas sem objectivo específico e sem que isso seja um frete.
  16. Ter vontade de ir para casa connosco depois de uma noite de copos, e não de ficar lá a fazer sabe deus o quê com os amigos.
  17. Ensinar e aprender coisas novas.
  18. Dar na mesma medida em que se recebe.
  19. Aparecer um dia num cavalo branco, com rosas vermelhas e um sorriso.
  20. Ser uma ajuda e um apoio constante, ser o nosso melhor amigo.
  21. Tornar a nossa vida mais fácil, em vez de a dificultar. Acrescentar vantagens, não problemas.
  22. Ter respeito e lucidez nas discussões que às vezes são inevitáveis e saudáveis.
  23. Cuidar da relação, não porque "tem de ser que isto está muito mau", mas sim porque se gosta.
  24. Cometer loucuras para o lado do bem e nunca para o mal.
  25. Acompanhar-nos ao consultório médico.
  26. Dar apoio quando os nossos familiares estão mal e nós sofremos com isso.
  27. Ficar, lutar, estrebuchar pela pessoa com quem queremos mesmo ficar. 
  28. Afastar firmemente os terceiros que possam vir a ser fonte de problemas. Não dar espaço a mal entendidos.
  29. Reconhecimento e gratidão.
  30. Não querer mais ninguém, nem sequer ter interesse.
  31. Reconhecer possíveis erros e não deixar que o orgulho nos impeça de pedir desculpa.
  32. Dar uma segunda oportunidade, mas não precisar de uma terceira nem quarta.
  33. Conhecer o endereço do nosso blog de cor e ler o que escrevemos.
  34. Poupar dinheiro em conjunto para viagens a dois. E ir.
  35. Poder dizer à pessoa que estamos muito, mas mesmo muito tristes, na certeza de que ela  não achará que estamos a "fazer filmes" e muito menos se rirá de nós.
  36. Poder dizer que estamos desiludidas, na certeza de que não seremos vistas como "umas chatas".
Algo a acrescentar?

quinta-feira, 28 de julho de 2011

the sins of our fathers

.
You are Isildur's heir, not Isildur himself.

A ver se não me esqueço disto nunca mais.

sábado, 23 de julho de 2011

girl with a dark bullet

I

A menina gostava de apanhar pedrinhas na areia da praia. Gostava especialmente da sua forma oval, polida pelo tempo, a brilhar ao sol, e pensava muito no caminho que cada pedrinha tinha levado até chegar ali, à sua mão pequena naquela praia.

E pensava em todas as histórias que a pedra, se não fosse pedra, teria testemunhado. E em tudo o que podia ter aprendido com elas, se não fosse pedra.

Numa manhã luminosa em que fazia o caminho até à Barrinha, picou o pé numa bem bicuda, que sobressaía entre a areia fresca. Pegou-lhe, lavou-a na água salgada e observou-a à luz. Era uma pedra grande, completamente negra e muito brilhante do mar, diferente de todas as outras que tinha visto até então. Mas não estava arredondada - parecia uma grande bala negra, com arestas cortantes. Quase parecia ter caído do céu naquele preciso lugar momentos antes, como um  míssil, em vez de ter rebolado debaixo dos oceanos durante anos e anos.

Na verdade, tinha rebolado ao sabor das ondas durante anos e anos, mas não tinha suavizado as arestas. A menina não sabia disso... e levou-a para casa.

No dia seguinte, a menina resolveu transformar a pedra numa peça de xadrez, como tinha visto num filme. Contou aos pais, que lhe deram um pequeno martelo para esculpir, e começou o seu trabalho. De vez em quando ia à praia procurar outras pedras que fossem mais fáceis de manejar, pois esta grande bala era um mono compacto, muito pesado para as suas pequenas mãos. Mas não encontrou nenhuma pedra igualmente brilhante, embora outras parecessem claramente mais fáceis de esculpir.

Sempre que parecia que a pedra estava a ganhar forma, uma pancada em falso criava novas arestas cortantes. A menina deixou de ir à água porque os pequenos cortes que tinha lhe faziam arder as mãos. Leu livros e comprou novas ferramentas, mas nada parecia resultar. A grande bala negra continuou um trambolho, muito longe da peça de xadrez que ela idealizava a king with no crown, king with no crown. Mas continuava bonita e brilhante, lá isso continuava. E a menina passava horas a apreciar as suas arestas à luz do sol e da lua.

Uma noite a seguir ao jantar, zangada, pegou na pedra e foi até à praia. Lançou-a ao mar, desistiu da ideia do xadrez, e voltou para casa, tudo sem os pais darem por nada.

II

Foi dormir, mas teve sonhos estranhos e confusos, que a fizeram acordar com o coração pequenino. E de manhã, mal olhou para a mesa-de-cabeceira, assustou-se: a pedra estava lá pousada. Estava diferente, parecia ainda mais bonita e também mais leve... resolveu recomeçar o seu trabalho.

O resto do verão foi passado a trabalhar na pedra, sempre com dificuldades. A menina esculpia e evitava pensar naquela manhã e no susto que apanhara. Mas o tempo foi passando, ela foi perdendo o bronze do sol e o seu cabelo loiro escureceu - os pais começavam a ficar preocupados. Tentaram fazê-la ver que aquilo não ia a lado nenhum.

E de facto, a menina acabou por perder algum do fascínio pela pedra, que se mantinha torta e desinteressante. Deixou-a em casa um dia e resolveu ir brincar para a praia. Durante uns dias não se lembrou dela: recuperou alguma da sua cor e alegria, passeou muito junto à água e colecionou conchas.

III

Faltava um mês para o fim das férias de verão quando a menina acordou a meio da noite alagada em suor. Tinha sonhado com homens maus que lhe cravavam a bala negra no coração, num ritual junto a uma grande cascata. Saiu da cama devagar e pôs-se de joelhos, a cabeça a tocar no tapete rugoso. Olhou para debaixo da cama - tinha-se esquecido, mas a pedra estava lá. Esticou o braço pequeno e recuperou-a, ficando a olhar para ela muito tempo, até se voltar a deitar e pousá-la na almofada.

Durante esse último mês das férias de verão, o seu trabalho na pedra deu frutos. A grande bala já se assemelhava a um Rei, embora continuasse com problemas na cabeça e a coroa ainda fosse indecifrável. Os pais ajudaram-na a esculpir a base, mas passado algum tempo perceberam que seria impossível fazer da pedra um Rei digno de um tabuleiro de xadrez. 

Tentaram mostrar à menina que havia outras coisas com que se entreter - livros, filmes, e até outras pedras para colecionar. Mas nada demovia a menina de 7 anos daquilo que parecia ter-se tornado a sua missão de vida. 

E, finalmente, depois de mais um dia de martelinho em punho, a menina achou que tinha atingido o seu objetivo: a grande bala negra tinha-se tornado um Rei. Claro que não era um Rei, Rei - a menina achou que seria arriscado investir muito na zona da coroa, pois podia arrancar-lhe a cabeça com o martelo - mas assemelhava-se a isso. A sua coroa fazia lembrar a cabeça dos Bispos nos tabuleiros de xadrez, com um grande espigão a apontar para o céu. Mas não fazia mal - era o seu Rei.

Feliz com a sua obra, mostrou-a às amigas e aos pais, que olharam de nariz torcido para o grande espigão-cabeça. As amigas riram-se dela e os pais preocuparam-se com ela. «Não andes a correr com isso na mão», avisaram. Mas a menina não ligou. E andava de bicicleta com o Rei posto no cestinho cor-de-rosa, ou passeava junto à água com ele na mão - gostava de o molhar e admirar o seu brilho ao sol.

No dia 29 de Setembro, na véspera do regresso a Lisboa, a menina de 7 anos saiu de casa entusiasmada e cruzou o pequeno pátio que a separava da areia da praia, com o Rei negro na mão. Procurou as amigas no areal, mas elas não estavam lá, pelo que voltou para trás e resolveu atravessar a estrada para as procurar na Ria, no lado oposto da ilha.

De costas para o mar, atravessou a estrada a correr - no preciso momento em que um jipe avançava destemido por entre os inúmeros carros estacionados em segunda fila naquela rua «Um dia que queira aqui chegar uma ambulância ou os bombeiros, não sei como vai ser!», tinha ouvido a avó dizer.

A menina abriu os olhos depois de um reboliço de cabelos e asfalto. Tinha dificuldade em respirar, sentia um nó apertado na garganta. Sentiu o seu corpo a ser virado de barriga para cima e viu uma senhora muito loira,  grávida, com a pele tostada pelo sol, a fitá-la com olhos azuis, estarrecidos e culpados.

Entre os gritos da população e a visão a fugir-lhe, distinguiu a figura do pai, barbudo e moreno, ajoelhado junto a ela. Tira-lhe isso da garganta! Chamem a ambulância! Arranjem um pano para estancar isto! Ele agarrou-lhe na nuca e ela sentiu uma grande pressão no pescoço, como se o nó que lhe entalava a garganta estivesse a ser desfeito lá dentro. Uma grande dor e um grande alívio, acompanhado por um banho morno que lhe inundou o pescoço, os ombros, o peito. 

Olhou para o que lhe tinha sido arrancado da garganta. Era a grande bala negra. Tinha retomado a sua forma de sempre se é que algum dia tinha mudado - já não era o Rei que ela pensava ter construído. Mantinha a forma do dia em que a tinha encontrado, o seu aspecto de míssil, as suas arestas cortantes. O seu brilho permanecia o mesmo, um brilho que a cegava debaixo do sol do meio-dia. 

A menina deixou-se maravilhar pelos reflexos de mil cores que a pedra criava na sua superfície lisa. Deixou de ouvir os gritos e não chegou a ouvir a ambulância a apitar entre os carros, lá longe. 

Porque, entretanto, fechou os olhos.

quarta-feira, 20 de julho de 2011

free advice

No outro dia disseram-me que o sofrimento nos torna humildes. Quando passamos por situações complicadas, somos obrigados a olhar para o que nos rodeia e para nós próprios e analisar o que falhou: em nós, nos outros, na própria situação.

Todo este processo torna-nos mais humildes. A arrogância e o ódio servem apenas para rejeitar uma preciosa lição de vida e mais tarde repetir os erros do Passado.

And we don't want that, do we?

quinta-feira, 14 de julho de 2011

don't come back for me


I know I can't take one more step towards you
Cause all that's waiting is regret
Don't you know I'm not your ghost anymore
You lost the love I loved the most

I learned to live, half alive
And now you want me one more time

And who do you think you are?
Running 'round leaving scars
Collecting your jar of hearts
And tearing love apart
You're gonna catch a cold
From the ice inside your soul
So don't come back for me
Who do you think you are?

I hear you're asking all around
If I am anywhere to be found
But I have grown too strong
To ever fall back in your arms

I've learned to live, half alive
And now you want me one more time

And who do you think you are?
Running 'round leaving scars
Collecting your jar of hearts
And tearing love apart
You're gonna catch a cold
From the ice inside your soul
So don't come back for me
Who do you think you are?

Dear, it took so long just to feel alright
Remember how to put back the light in my eyes
I wish I had missed the first time that we kissed
Cause you broke all your promises
And now you're back
You don't get to get me back

And who do you think you are?
Running around leaving scars
Collecting your jar of hearts
And tearing love apart
You're gonna catch a cold
From the ice inside your soul
So don't come back for me
Don't come back at all

Who do you think you are?

quarta-feira, 29 de junho de 2011

mad architect



All the choices I once made, the paths that I designed
Have formed this endless labyrinth, a product of my mind.


Uma vez quando era miúda ia acertar o relógio de pulso e, mal tentei puxar a rodinha lateral para fora, descolei ligeiramente a unha do dedo indicador. Lembro-me daquela sensação – um misto de dor e estupidez – e de me ter perguntado, enquanto apertava o dedo com força com a outra mão, por que carga de água tinha puxado aquilo assim e que agora já não havia nada a fazer, porque a unha descolada estava. Senti o mesmo noutra ocasião, ainda mais miúda, quando vesti uma camisola de lã sem fechar os olhos.

Nessas alturas, na minha inocência, pensei no quão rapidamente a vida de uma pessoa pode mudar, por via de pequenos gestos impensados. 

Recentemente senti o mesmo. Aliás, senti que muito pouco nesta vida está nas nossas mãos. Nunca fui de acreditar muito no destino, mas a forma como os acontecimentos se encadearam nestes últimos 10 dias, a forma como fui irremediavelmente levada para uma situação, fez-me mudar de ideias.

O arquiteto louco está lá em cima, a brincar connosco. E ele arquitetou este esquema de forma perfeita. Há que elogiá-lo. Eu, com o meu feitio, não poderia ter reagido de forma absolutamente nenhuma a não ser da forma como reagi aos acontecimentos que se sucederam numa catadupa imparável e impressionante.

Corredores escuros, curvas repentinas, espelhos e portas giratórias… eu bem que corri. Mas não tive hipótese: o meu barquinho de papel foi levado, devagar mas firmemente, pelo caminho que tinha de seguir. É assustador como todas as peças encaixaram de forma a que eu acreditasse em algo que me fez tomar decisões irremediáveis. Quando não tomamos decisões, a Vida toma-as por nós. Sinto-me enganada por Ela. 

E agora pronto, fui desembocar ao meu oceano cinzento outra vez. Muita poesia há de vir para aí, muitos textos, muita lamechice, muito Eu. Mas ao menos sei que posso cruzar os braços, porque o meu barquinho há de seguir o rumo que o arquiteto quiser, como e quando quiser. E só me resta tentar sobreviver à viagem.

Adotei o novo Acordo Ortográfico. Ou tentei.

quinta-feira, 23 de junho de 2011

one step closer to The One

Eu fiz por acreditar que não existiam príncipes encantados.

Agarrei-me com força às histórias de amores conturbados e que acabam sempre por resultar no fim. Agarrei-me à Carrie e ao Big. Às migalhas que recebia de vez em quando. Agarrei-me à desculpa do teu passado, que te queimou e só deixou cinzas, carvão e paredes escurecidas pelo fumo para partilhares comigo. E agarrei-me a esta modernidade, em que (dizem) já não há tempo para palavras doces nem surpresas maravilhosas.

Mas chega de acreditar em mentiras, chegou a hora de conseguir ver a Verdade. Essa verdade que tantas vezes transbordou para as páginas deste blogue, de formas tão assustadoras que eu a postava e depois apagava, para não ter de voltar a ler.

Já ninguém cala esta Verdade, ela grita-me aos ouvidos. Nas vozes de todos os meus amigos, conhecidos, dos meus pais, familiares e até nas vozes dos teus amigos. E a voz que se ouve mais baixa é a minha. Mas sim, ela também está lá.

Eu fiz por acreditar que não existem príncipes encantados. Foi mais fácil do que acreditar que eles existem, que o meu existe, mas que não és tu.

Texto escrito a 14 de Fevereiro de 2010. Hoje vale a pena publicar.

domingo, 15 de maio de 2011

forever

O verdadeiro amigo é aquele que nos apoia, ajuda e protege incondicionalmente em todas as escolhas ou aquele que nos apoia, ajuda e protege nas escolhas que considera correctas para nós?

segunda-feira, 18 de abril de 2011

You may fool all the people some of the time...


...you can even fool some of the people all of the time, 

but you cannot fool all of the people all the time.

 

Abraham Lincoln


Acho que todos deviam ler este texto, não porque fui eu a escrevê-lo, mas porque há que estar informado sobre o que se passa em nossa casa.

O Estado usa os impostos para apoiar empresas e oferecer ajuda em várias vertentes sociais. Mas como esse dinheiro não chega e não é bem gerido, tem sempre de pedir empréstimos a bancos no estrangeiro.

Esses empréstimos são dados mediante um juro, que é calculado com base na avaliação que as agências de rating fazem sobre o desempenho de cada país.

Se um país produzir, tiver riqueza, os bancos consideram que os empréstimos são um investimento com um risco relativamente reduzido. Mas se o país não produzir muito, os bancos já consideram que o país se arrisca a não pagar o empréstimo, logo, aumentam o juro.

O problema são os critérios das agências de rating, porque elas é que fazem essa avaliação.

Ora, segundo o sociólogo Robert Fishman, que escreveu para o NY Times, Portugal estava a conseguir sair da recessão, não havendo razões para as agências nos darem má classificação, nem para os bancos aumentarem os juros.

Mas eles fizeram-no. A questão é PORQUÊ?

Se um Estado não tiver dinheiro para se financiar, ainda menos dinheiro tem para investir no seu País e nos seus cidadãos.

Logo, uma enorme fatia de negócio (saúde, educação, transportes, etc.) fica à disposição de empresas privadas, que podem avançar.

No fundo, estamos a assistir a uma tentativa dos grandes grupos económicos de fazer mais dinheiro, "roubando" negócio ao Estado.

A privatização destes serviços é encarada por alguns como a solução para o Estado conseguir pagar a dívida... E assim se caminhará para o fim do Estado Social.

O Fundo Monetário Internacional só teve de intervir porque as agências de rating "se lembraram", num ataque bem orquestrado contra Portugal, de descer brutalmente a nossa classificação, fazendo disparar os juros e obrigando a pedir "ajuda" para conseguir pagar os empréstimos.

Mas na verdade esta "ajuda" também nos vai endividar indefinidamente, porque também o FMI cobra juros.

Temos de agir já! Juntem-se a esta causa e convidem os vossos amigos.

Conto com o vosso apoio, pela nossa alegre casinha.

sexta-feira, 1 de abril de 2011

obey



Sempre que vou contra a vontade dos meus pais, sinto-me quase como se me tivessem arrancado um bocado de carne.

O desejo de agradar, de ser uma fonte de orgulho, de não contrariar sim, claro que também fiz as minhas birras e no fundo o não ser capaz de dizer "não" sempre estiveram lá. Primeiro porque não podia dizer não, depois porque não queria fazê-lo.

E é sempre a primeira coisa que me passa pela cabeça em variadíssimas situações da vida: o que é o que meus pais pensariam disto?

Tenho pavor de que se esqueçam de quem eu sou, por causa desta ou daquela escolha que faça.

Portanto olha... seja o que deus quiser.

sexta-feira, 25 de março de 2011

UNITED

"Se as eleições fossem hoje, o centro-direita leia-se PSD reuniria mais de metade das intenções de voto". Faz-me impressão a cambada de débeis mentais que constitui a nossa sociedade. As intenções de voto são determinadas por um único factor: o ódio que têm nesse momento contra o partido que governou anteriormente.

E assim continuaremos.

Fala-se numa grande união da Esquerda, e na minha opinião essa é a única hipótese para algum dia termos no poder um partido que não seja o PS ou o PSD. Só assim o número de votantes de Esquerda poderia ultrapassar o dos acéfalos responsáveis pela manutenção desta rotatividade.

Mas uma união entre partidos de Esquerda implica necessariamente que alguns princípios ganhem em relação a outros. Que nasça uma ideologia com opiniões, propostas e perspectivas variadas, daqui e dali. Qual seria o resultado desse casamento? Qual o peso de cada partido no novo "filhote"?

Estaria o PCP disposto a dissolver-se em algo um pouco diferente do "extremismo" da ideologia que o inspira (e que assusta a generalidade das pessoas)? Ou o BE e os Verdes, por exemplo, dispostos a aproximarem-se dessa mesma ideologia?

Parece-me que lhes falta a todos os intelectuais de Esquerda alguma humildade para que isto possa acontecer.

Desculpem o devaneio mas isto fez-me lembrar dois colegas de um Workshop que ando a fazer, na área do cinema. Tivemos a tarefa de escrever uma história, dois a dois, com base em personagens que nos foram distribuídas. Estes dois colegas são os únicos do Workshop que são mesmo licenciados na área de Cinema. E foram os únicos que não conseguiram trabalhar em conjunto: apresentaram duas histórias individuais, porque não conseguiram descer do seu pedestal de cineasta e aceitar misturar o seu génio cinematográfico um com o outro. O resultado de ambos foi lamentável, deixem que vos diga. As piores histórias da turma.

Serão os partidos de Esquerda capazes de descer do seu pedestal? De aceitar que as suas ideias não são sagradas nem estão escritas na pedra e que podem vir a ganhar muito com a intervenção de outras pessoas?  Seriam eles capazes de abdicar de certas opiniões para criar algo totalmente novo, bonito e, quem sabe, revolucionário (no sentido não assustador da palavra) para o nosso país? E de preferência não um monstro.

Duvido. Mas era muito fixe.

quarta-feira, 23 de março de 2011

"arrebenta a bolha"

O Governo está prestes a cair, diz-se. Daqui a umas horas, diz-se.

A demissão de um governante é vista como uma forma de sair de cena com a cabeça erguida. Num misto de puto mimado e dama incompreendida, o governante sai, por "não ter condições para continuar", porque estão todos contra ele - oposição, povo, o seu próprio Governo - e porque assim Portugal se tornou impossível de governar.

O governante sai atribuindo a culpa à situação, às condições, à oposição, ao povo que o elegeu e que agora se revolta. A demissão é tida como um acto de honra, em que alguém admite que erros foram cometidos e, tal qual japonês intocável, escolhe o harakiri para se retirar e ser lembrado para sempre de cara lavada, pois "pelo menos admitiu que não presta".

Mas uma demissão não é nenhum acto honrado, de quem fez tudo mas não conseguiu. Um governante que se demite, admite a sua incompetência e da sua equipa. Está, no fundo, a fugir com o rabo à seringa de um cargo para o qual se candidatou e para o qual fez campanha, na certeza de que seria a pessoa mais indicada no País inteiro para o desempenhar.

Por isso, na minha opinião, a demissão de um governante não deve ser bem aceite, e muito menos sugerida pelo povo. O dever do governante é cumprir a função para a qual foi eleito. Não há cá "ah afinal não consigo". Não consigo? Estudasse!

Por isso estou um bocadinho triste com a queda do Governo. É apenas outro que diz "já não quero brincar mais" e dá lugar ao próximo que, muito provavelmente, se cansará de brincar também.

segunda-feira, 14 de março de 2011

monstro

Cerca de 300 mil pessoas participaram a nível nacional. Cerca de 300 mil pessoas tiveram vontade suficiente para sair das suas casas e ir mostrar o seu desagrado em relação à situação do país. Mas sabemos que o número de desagradados ronda os 10 milhões.

Agora, no rescaldo das manifestações, ouvem-se vozes que pedem a formação de um novo partido. Está tudo a encaixar. O partido que surgir, se surgir, e se for só um, pode ser visto como uma espécie de salvação da Pátria. Tal como Hitler foi, na altura. 

Cuidado, muito cuidado.

Por isso sou contra a "sangria desatada" que se desencadeou desde sábado. Sou contra a destituição de um Governo via Facebook. Sou muito a favor da manifestação das nossas opiniões, mas também muito a favor da reflexão e da ponderação.

Faço votos de que os ânimos se acalmem, sob pena de que venha a nascer, desta manifestação pacífica e de alegria, uma qualquer monstruosidade.

quero ser feliz



morte à máfia da partidocracia

flexitanga, seguritreta

liberdade, igualdade, fraternidade

quero ser feliz, porra!

quinta-feira, 10 de março de 2011

geração parva

Realmente a quantidade de desinformação que circula nos media, muitas vezes veiculada por odiosos "opinion makers", é assustadora. Eu, que vou manifestar-me no próximo Sábado, já estava a ficar confusa. Pela destituição de toda a classe política? Pelo financiamento dos partidos políticos exclusivamente com base nos seus próprios rendimentos? Contra os nossos pais, porque a culpa é deles?

Não.

É melhor relermos o Manifesto. E agora sim, sem sobra de dúvida, até Sábado.

Manifesto

Nós, desempregados, “quinhentoseuristas” e outros mal remunerados, escravos disfarçados, subcontratados, contratados a prazo, falsos trabalhadores independentes, trabalhadores intermitentes, estagiários, bolseiros, trabalhadores-estudantes, estudantes, mães, pais e filhos de Portugal.

Nós, que até agora compactuámos com esta condição, estamos aqui, hoje, para dar o nosso contributo no sentido de desencadear uma mudança qualitativa do país. Estamos aqui, hoje, porque não podemos continuar a aceitar a situação precária para a qual fomos arrastados. Estamos aqui, hoje, porque nos esforçamos diariamente para merecer um futuro digno, com estabilidade e segurança em todas as áreas da nossa vida.

Protestamos para que todos os responsáveis pela nossa actual situação de incerteza - políticos, empregadores e nós mesmos – actuem em conjunto para uma alteração rápida desta realidade, que se tornou insustentável.

Caso contrário:

a) Defrauda-se o presente, por não termos a oportunidade de concretizar o nosso potencial, bloqueando a melhoria das condições económicas e sociais do país. Desperdiçam-se as aspirações de toda uma geração, que não pode prosperar.

b) Insulta-se o passado, porque as gerações anteriores trabalharam pelo nosso acesso à educação, pela nossa segurança, pelos nossos direitos laborais e pela nossa liberdade. Desperdiçam-se décadas de esforço, investimento e dedicação.

c) Hipoteca-se o futuro, que se vislumbra sem educação de qualidade para todos e sem reformas justas para aqueles que trabalham toda a vida. Desperdiçam-se os recursos e competências que poderiam levar o país ao sucesso económico.

Somos a geração com o maior nível de formação na história do país. Por isso, não nos deixamos abater pelo cansaço, nem pela frustração, nem pela falta de perspectivas. Acreditamos que temos os recursos e as ferramentas para dar um futuro melhor a nós mesmos e a Portugal.

Não protestamos contra as outras gerações. Apenas não estamos, nem queremos estar à espera que os problemas se resolvam. Protestamos por uma solução e queremos ser parte dela.

quinta-feira, 24 de fevereiro de 2011

o fim do horário nobre

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A propósito de famílias particularmente conflituosas, como é o caso de alguns veios da minha, no outro dia ouvi uma coisa numa aula que me fez pensar.

Os tempos estão a mudar, ou melhor, mudaram. Uma certa ramificação da minha família está a viver um choque de gerações complicado. Os quatro miúdos, agora com 18-25 anos, não se revêem nos pais. Os pais não reconhecem os miúdos.

Não há confidências - aparentemente não há confiança para isso. Não há sequer conversas. A não ser aquelas que são obrigatórias, à mesa, sob ameaças de abandono ou de serem postos fora de casa. Nesta família, os tempos de calmaria intercalam com temporais de berros e com momentos de silêncio constrangedor.

Então mas porquê? Eu gosto muito desta pergunta. Porque os tempos estão a mudar, ou melhor, mudaram - e, entre muitas outras mudanças, o horário nobre acabou.

As famílias adquiriram novos hábitos, desenvolvidos por vezes pelos mais novos, como é natural. Dos curtos serões em torno da rádio, passámos aos mais longos em frente à televisão. E daí passámos ao "acabou-o-jantar-vou-para-o-computador".

O "fim do horário nobre" pode ter tido efeitos poderosos nas agências de publicidade, a quem antigamente bastava preencher 30 segundos dos "reclames" para conseguirem vender o seu peixe. Mas também teve efeitos poderosos nas dinâmicas familiares - veio criar um fosso entre pais e filhos, que antes se sentavam todos juntos e discutiam assuntos comuns. Dias e dias sem "assuntos comuns" têm um resultado inevitável: filhos e pais tornam-se desconhecidos, os pais cada vez mais desinteressantes e os filhos cada vez mais desinteressados.

Como ultrapassar, então, o fosso criado? O salto tem de ser dado pelos pais. Não peçam aos filhos para se voltarem a sentar em frente à televisão. Não lhes peçam para acompanhar a novela convosco. O horário nobre acabou.

Terão de ser vocês a sentarem-se junto deles. Como? 

Criem uma conta no Facebook. Vejam vídeos no YouTube. Descubram o que é o Tumblr, o Foursquare ou o Digg. Enviem-lhes um e-mail com um vídeo engraçado de vez em quando. Mas não se tornem spammers, nem stalkers já agora... não se ponham a comentar perfis como se não houvesse amanhã. Escrevam num blog! Entrem no mundo dos vossos filhos, já que eles não querem ter muito a ver com o vosso. No fundo, actualizem-se!

Parece-me que enquanto não aceitarem que os tempos mudaram e vocês também têm de mudar, enquanto não reconhecerem que o horário nobre acabou... os vossos filhos não vos vão dar mais tempo de antena.

segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011

jovens velhos

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Uma pessoa mantém-se jovem enquanto conseguir aprender coisas novas, mudar os seus hábitos e aceitar pontos de vista diferentes do seu. 

O que não significa que tenhamos de gostar dos de toda a gente.

quarta-feira, 9 de fevereiro de 2011

be my best friend and I'll love you forever

No outro dia recebi uma mensagem bonita pelo Facebook que falava sobre os amigos que temos ou tínhamos e a dificuldade que parece haver hoje em dia em mantê-los. Identifiquei-me bastante com a mensagem. Nestes últimos anos não foram raras as vezes em que pensei, com tristeza, "another one bites the dust".

Parece que, se temos muita facilidade em perdoar as desavenças com os namorados/as, temos a mesma dificuldade em fazê-lo quando se trata de um amigo ou amiga. E não devia ser assim, pois sempre ouvi dizer e disse que os homens vêm e vão, mas as amigas são para sempre.

Sejam desentendimentos, palavras mais duras, o dizer a nossa verdade e por vezes a verdade de todos os outros mas que mais ninguém se dá ao trabalho de afirmar ou simplesmente o rumo da vida... é um facto que a maioria dos meus amigos de ontem já não são os de hoje.

Éramos amigos de infância, crescemos, mudámos e quando dei por isso, não tínhamos nada em comum.
Por isso às vezes gostava de dizer que já não me apetece estar com eles, que as conversas não mudam, que eles não evoluíram, ainda têm as mesmas preocupações que tínhamos aos 16 anos, tornaram-se aborrecidos e mortiços umas múmias como alguém os descreve. Acredito que as suas vidas sejam interessantíssimas, mas quando se combinam com a minha, o resultado fica aquém das expectativas. It's not you, it's me. Maybe.

Gostava de dizer isto tudo ou partes disto tudo, mas se já o fiz uma vez recentemente, e não disse tudo, já foi demais e já me arrependi. Por isso o melhor é ficar calada, mesmo que os meus amigos de ontem já não sejam os de hoje...

Talvez sejam os de amanhã.

segunda-feira, 17 de janeiro de 2011

psychos


Estudos comprovam que mais de metade da população feminina mundial sofre de problemas mentais, mais ou menos graves. 

The definition of mental health problems used in the new study includes low self-esteem, poor self-confidence, and stress.

Auto-estima baixa, pouca confiança em si mesma e stress... ok, acho que também tenho problemas mentais. Se mais de metade das mulheres inquiridas apresentaram distúrbios mentais, não estará na altura de redefinir o que é normal, numa mulher, em termos mentais ou emocionais? 

Parece-me que stress e pouca auto-estima são coisas pelas quais todas nós passamos, em algum momento das nossas vidas. E nessas alturas, conforme diz o estudo, a algumas dá-lhes para a promiscuidade, a outras dá-lhes para se cortarem, a outras dá-lhes para desaparecerem, passarem uma noite fora de casa, etc.

No fundo são formas diferentes de tentar dizer "eu estou aqui e preciso de qualquer coisa", mas será isso um sintoma de uma doença mental que precisa de tratamento? Precisamos de tratamento ou precisamos de amor? Ou, quem sabe, precisamos de um par de estalos?

Depression is expected to become the world's second biggest health problem after heart disease by 2020, according to the World Health Organisation.

Não quero de forma alguma menosprezar os problemas que cada uma tem, alguns deles bem reais e bem graves. Mas numa era em que ter daddy issues é fixe e em que facilmente se confunde um simples desgosto de amor com uma depressão clínica, eu pergunto: estará a nossa sociedade que exige às mulheres que trabalhem, cuidem da casa, eduquem os filhos, façam exercício, e ainda que sejam bonitas enquanto o fazem a produzir exércitos de super-mulheres com distúrbios psíquicos? 

Ou será que os psicólogos, psiquiatras, terapeutas... estão apenas a tentar vender o seu peixe?

terça-feira, 11 de janeiro de 2011

I wanna be a billionaire so freakin bad...


O assassinato de Carlos Castro deu o mote para escrever um texto que tenho entalado há alguns meses. Sobre o "deslumbramento económico" (que eu antes não sabia que se chamava assim, mas é realmente uma boa definição), os seus males e, agora, os seus perigos.

Eu ia falar sobre todas as coisas que temos e que acabam por nos ter a nós, sobre a nossa incapacidade para apreciar as pequenas coisas, sobre o nosso desejo constante de ter mais e mais e sobre a infelicidade em que acabamos por viver, por tudo isto. Gostava de saber em que dia se deu essa viragem: o dia em que parámos de apreciar aquilo que temos e passámos a viver na insatisfação permanente.

Passámos a primeira madrugada do ano a discutir essa tal coisa de deslumbramento económico: o estado em que os portugueses, frutos verdes da revolução de Abril, se encontram neste momento. Uma fase. Que deve estar para terminar em breve. Uma fase de bolsos cheios mas cada vez mais de dívidas, de carros novos, unhas de gel, Coca Cola, Prada e e-bay. E televisão por cabo.

E é sobre a televisão por cabo (os media, vá) que eu gostava de falar um bocadinho. Renato Seabra é um exemplo acabado (como tantos outros) de como se vai from zero to hero e depois de bestial a besta outra vez, na televisão. E por causa da televisão. Não sabendo ainda a verdade dos factos, há teorias que dizem que Renato se aproximou de Carlos Castro para subir na vida, para se tornar um modelo famoso.

Já falei disto várias vezes e já se falou disto várias vezes. Somos bombardeados por imagens de beleza e juventude diariamente. As velhas já não são velhas as mulheres aos 60 anos já não são como as de antigamente, existe o culto da juventude eterna, não só em termos físicos mas também mentais, ou melhor, de estilo de vida.

Os eternos Peter Pans, se aos 30 anos parecem ter e vivem como aos 18, aos 60 anos parecerão ter 35. É isso que se pretende. Live fast, die young, make a lovely corpse é algo do passado. Queremos viver muitos anos, viver muito durante esses muitos anos e morrer muito bonitos na mesma. Hoje em dia, chamam-se homens “bons” aos homens bonitos. E mulheres “boas”. Isto deve querer dizer alguma coisa, não?

Talvez por isso tenham surgido hordas de comentários no site do PÚBLICO de pessoas que se insurgiram contra Carlos Castro e a favor de Renato Seabra. Contra o velho flácido patético, a favor do jovem vigoroso, modelo, de sorriso impecável. O jovem vigoroso usou um saca rolhas para mutilar o velho flácido, depois de o espancar com um monitor? Fez ele muito bem, que nojeira, aquele velho flácido! Triste.

Está recheado de ironias, este homicídio.

Queremos a eternidade, queremos ser a honra, o herói, a lenda. Não importa muito como. O Renato conseguiu, em parte. Mas será que ainda há lendas na era dos 15 minutos de fama? Até onde iremos… to be one of the beautiful?



E como é que volta atrás? Como é que se desliga isto I know that I can turn you on  I wish I could just turn you off, I never wanted this. ?

A resposta não é desligar a televisão, ou eliminar o contacto com esse mundo de estrelas. Isso seria voltar à caverna. Eu invejava as crianças em África que conseguiam viver felizes com a sua bola de futebol furada. Mas a verdade é que também elas, como qualquer ser humano, seriam infelizes se soubessem que podiam viver muito melhor do que vivem mas não o conseguissem alcançar.

A resposta não é voltar à caverna. É saber lidar com o facto de uns estarem "no topo" e nós um bocadinho cá mais abaixo, entre os demais. A resposta está em tomar consciência de que, independentemente do dinheiro que se possa ter, a nossa vida, individual, familiar, as nossas pequenas particularidades, as nossas ideias, não têm preço. Não são desprezíveis, não são mais do mesmo, não são uma gota no oceano.  Têm um valor inestimável.

Na verdade somos ricos, só temos de o saber ver para sermos felizes.